É preciso voltar sempre de novo a Jesus de Nazaré, à sua pessoa e prática.
Na última Assembleia Nacional da CNBB foram aprovadas as novas Diretrizes Gerais para a Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, pra o período de 2011 a 2015. É nessas diretrizes que as dioceses, paróquias e comunidades, pastorais, movimentos e organismos eclesiais devem encontrar a inspiração para desenvolver seu planejamento e sua ação pastoral. Bem mais que nas diretrizes anteriores, nestas últimas aparece, de forma clara, o que foi decidido no Documento de Aparecida, isto é, que nossa ação pastoral deve passar da manutenção para a criatividade, deve deixar de ser uma pastoral da conservação e tornar-se uma pastoral decididamente missionária.
Para isso, as novas diretrizes sugerem que o ponto de partida seja Jesus Cristo. É preciso voltar sempre de novo a Jesus de Nazaré, à sua pessoa e prática, para sermos seus discípulos e missionários e, com ele, anunciarmos o Reino de Deus nos dias de hoje. As diretrizes sugerem duas atitudes: alteridade e gratuidade. Alteridade se refere à abertura que se deve ter ao outro, ao diferente, na prática do respeito, do encontro, do diálogo e da partilha. Gratuidade se refere à prática de Jesus, que ia ao encontro dos outros sem esperar nada em troca, não entrando na lógica do lucro e do mercado e evitando práticas que geram violência e destruição.
UM NOVO JEITO DE SER IGREJA
Depois de lembrar que vivemos uma mudança de época, na qual é preciso superar tanto o relativismo frouxo como o fundamentalismo fanático, as novas diretrizes indicam urgências evangelizadoras que mexem com nossa concepção e prática de Igreja. Segundo Dom Raymundo Damasceno Assis, cardeal-arcebispo de Aparecida e presidente da CNBB, as diretrizes apontam para “uma Igreja que se firma no discipulado de Jesus Cristo, voltando-se ainda mais às fontes da fé; uma Igreja que se coloca, de modo inquestionável, ao lado da vida, em especial a vida fragilizada, ameaçada e desrespeitada; uma Igreja samaritana, irmã dos mais pobres e que se quer cada vez mais aberta ao diálogo ecumênico e interreligioso; uma Igreja, em que cada batizado reconhece e assume o valor testemunhal de sua própria vida”.
As cinco grandes urgências evangelizadoras elencadas pelas diretrizes são: a Igreja em estado permanente de missão; a Igreja como casa da iniciação cristã; a Igreja como o lugar da animação bíblica de toda a vida; a Igreja como comunidade de comunidades; a Igreja a serviço da vida plena para todos. Na primeira e na última dessas urgências, como que uma moldura para as outras três, percebe-se que a Igreja deve estar voltada para fora, para a missão, para a encarnação no mundo, o diálogo com a sociedade, o encontro com as culturas, o serviço dos pobres, a transformação da realidade. Nas outras três, a Igreja deve estar voltada para Deus, para o mistério da graça que lhe é dada, a força que lhe vem da Palavra e dos Sacramentos.
UMA IGREJA DA MISSÃO
A primeira das urgências evangelizadoras é pôr a Igreja em estado permanente de missão. Isso exige uma verdadeira conversão pastoral, implica em atitudes e iniciativas de auto-avaliação, mudança de estruturas pastorais, novos métodos e atitudes, a fim de fazer com que todos os batizados sejam apaixonados por Jesus Cristo, pelo Reino de Deus e pelo anúncio do Evangelho. Outra urgência evangelizadora que aponta para fora é colocar a Igreja a serviço da vida plena para todos, em favor das pessoas e grupos necessitados e da própria natureza. Isso exige capacidade para os gritos proféticos diante dos ataques que a vida sofre da parte da lógica do mercado. Deve-se defender a vida que, em todos os seus tempos, se vê ameaçada: no seu início, pelas leis pró-aborto; no seu fim natural, pelas leis pró-eutanásia; no seu percurso, pelas carências de subsistência e segurança, condições de saúde e educação. Torna-se necessário retomar a opção pelos pobres que, como disse o papa Bento XVI em Aparecida, “está implícita na fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para nos enriquecer com sua pobreza”. Essa opção faz que os batizados se tornem os samaritanos de hoje e vão em socorro dos últimos, dos indefesos, marginalizados, excluídos.
UMA IGREJA DE DISCÍPULOS
As outras urgências evangelizadoras insistem em temas que se fazem presentes entre nós desde o Concílio Vaticano II, mas que ganham agora um realce novo: iniciação cristã, animação bíblica e rede de comunidades.
Nossas famílias já não conseguem transmitir a fé como em outros tempos. Então, a comunidade eclesial deve insistir mais na iniciação cristã. Há muitas pessoas – crianças, jovens e adultos – que recebem os sacramentos da iniciação cristã, mas que não são devidamente evangelizadas. No mundo plural em que vivemos, urge atuar na formação cristã dos batizados, a fim de que sejam verdadeiramente iniciados nos mistérios de Deus, no caminho da santidade, na leitura e na prática da Palavra, no conhecimento das verdades da fé. O recurso ao catecumenato dos primeiros séculos do cristianismo, atualizado para nossos tempos, é um caminho que se abre para a nova evangelização.
A animação bíblica deve fazer com que a Palavra de Deus esteja à frente de toda obra evangelizadora. Carecemos de um catolicismo bíblico. O recurso à religiosidade popular e a devoções tradicionais não evangelizam se não estiverem profundamente marcados pela Palavra. Os métodos de leitura orante da Palavra são apontados pelas diretrizes como caminho da verdadeira evangelização. É preciso levar a Bíblia para as mãos do povo, nos grupos bíblicos em família, nas comunidades, nos encontros de catequese, nas pastorais e movimentos, em todo espaço e tempo.
Rede de comunidades! No mundo de hoje busca-se trabalhar em rede. Também na Igreja. Para isso, é preciso valorizar a vida comunitária e resgatar as práticas locais. Existem muitas experiências comunitárias nas cidades, nas periferias, no mundo rural. As novas diretrizes valorizam as Comunidades Eclesiais de Base ao lado de novas experiências comunitárias, como os círculos bíblicos, os grupos de família, as novas comunidades. Sugerem que nossas paróquias sejam setorizadas, a fim de que o Evangelho possa chegar em todos os ambientes e realidades, onde vive o povo.
Enfim, é preciso considerar que só nos tornaremos verdadeiros discípulos e missionários se anunciarmos a mensagem cristã não em primeiro lugar aos outros, mas a nós mesmos, cumprindo as exigências de Jesus e fazendo dele nosso ponto de partida.
Pe. Vitor Galdino Feller
Coord. Arquidiocesano de Pastoral, Prof. de Teologia e Diretor do ITESC
Fonte: Jornal da Arquidiocese